Reorganizando organizações: Como fomentar inovação, colaboração e adaptabilidade?

*por Herman Bessler

Quando se trata de impulsionar a inovação, a colaboração, a adaptabilidade e o intraempreendedorismo, algumas estruturas organizacionais são simplesmente melhores que outras.

A estrutura taylorista de comando e controle, baseada na divisão em departamentos e hierarquias rígidas, entregou a previsibilidade e eficiência de escala que levaram à economia industrial, atuando como motor do crescimento durante mais de 100 anos. A sociedade do século XX foi forjada no chão de fábrica, em uma linha de produção. Incapaz de produzir comportamentos imprevisíveis (e portanto inovação), esse paradigma de gestão se tornou um risco competitivo e uma fonte de perda de talentos insustentável. A sociedade do século XXI está sendo forjada na nuvem. Nos últimos 20 anos, centenas de organizações pioneiras vêm experimentando novas soluções de design organizacional e colhendo os frutos de forma desproporcional. Elas estão se tornando cada vez mais fortes sob pressão, e resilientes.

CEOs, acionistas e empreendedores têm consciência dessa realidade. Entendem a necessidade de mudar para sobreviver, de inovar como prática cotidiana, de aumentar a colaboração entre as equipes. Mas ao olhar para suas organizações com centenas ou milhares de pessoas, se deparam com um mar de complexidade inimaginável. Desenvolver um plano de transformação detalhado considerando as milhares de variáveis existentes parece um pesadelo. Executar tal plano ao longo de múltiplos anos disseminando em ondas as práticas e processos padronizados em dezenas de departamentos é simplesmente impossível. E a pressão aumenta dia após dia para embarcar em cada nova tecnologia disruptiva que surge, para trabalhar com startups inovadoras, para organizar seus dados e para criar squads e para colocar o foco no cliente usando design thinking e para criar programas de intraempreendedorismo e…

Organizações adaptáveis não se transformam a partir de planos, nem de ordens, nem tem práticas tão padronizadas assim. Elas experimentam com novas estruturas, papéis e modelos de autoridade. O que há de comum entre todos os experimentos bem sucedidos é a busca por distribuir autonomia para um número maior de pessoas e times, descentralizando o poder de decisão. São modelos menos rígidos, onde times de projeto podem se formar para além das fronteiras dos departamentos. Onde times de produtos atuam como startups quase independentes. Onde rituais para debater e direcionar a transformação são conduzidos de forma voluntária por pessoas, para pessoas.

Uma das estruturas mais populares presentes neste universo é a metodologia ágil. Ela é amplamente utilizada em projetos de tecnologia e se baseia em princípios de flexibilidade, velocidade e colaboração. A agilidade se tornou a moda da vez nas corporações brasileiras, muitas vezes implementando rituais, termos e o modelo de squads sem disseminar a cultura, os modos de pensar e os princípios do manifesto ágil.

Outra estrutura que tem ganhado espaço é a organização matricial. Ela combina elementos de estruturas funcionais e de projetos, permitindo maior flexibilidade e eficiência. Isso é especialmente útil em empresas que lidam com projetos complexos e muitas BUs. Ambas as estruturas (ágil e matricial) foram combinadas para criar o “ágil matricial”, implementado com sucesso pelo Spotify que compartilha os muitos aprendizados no Blog destinado ao assunto e pela australiana Atlassian.

Já a holocracia é uma estrutura organizacional que tem se mostrado eficaz em vários casos. Ela se baseia na autonomia e responsabilidade de todos os membros da equipe e na descentralização da tomada de decisão. A estrutura é mais fluida, o que garante maior flexibilidade e adaptabilidade, além de fomentar o intraempreendedorismo. Casos famosos de implementação incluem a Zappos e a plataforma de blogging Medium. A prática está bem documentada na página ​​holocracy.org. Os desafios são imensos, uma vez que a coordenação entre os agentes exige um emprego significativo de energia, mas se superados o modelo pode se mostrar bastante funcional.

Por fim, o modelo flatland é uma estrutura organizacional que tem se mostrado eficaz em empresas que buscam inovação e colaboração ao redor do mundo e possuem apetite para a disrupção. Ele se baseia na ideia de eliminar todos os gerentes, os chefes, a hierarquia formal. Ao invés desta, emerge a hierarquia não-formal e situacional, baseada em experiência, relevância e reputação acerca de cada tema. A eliminação de gerentes na estrutura organizacional permite ao mesmo tempo destravar autonomia e economizar custos. Um caso relevante é o da empresa de games Valve, que descreve a prática de forma lúdica no seu “guia para novos colaboradores (handbook for new employees)”. O modelo é um tanto radical e não se aplica a todas as realidades. Mas pode ser testado em times e unidades de negócio específicas, ou gradualmente implementado.

Essas estruturas organizacionais podem ser combinadas e remixadas de acordo com as necessidades específicas de cada empresa. O importante é que a organização esteja aberta a experimentar novos métodos e encontrar aqueles que melhor se adaptam ao seu contexto e a sua cultura. Não há uma estrutura organizacional única que seja a melhor para todas as empresas, o que não significa que todas sejam igualmente boas. Por exemplo, uma empresa pode combinar elementos da holocracia com rituais de métodos ágeis, assim como aplicar squads para times de tecnologia e uma estrutura matricial na sua operação tradicional. A implementação de uma estrutura customizada também requer uma abordagem de experimentação em ciclos curtos e ajustes regulares para garantir que ela continue sendo eficaz à medida que a empresa evolui e enfrenta novos desafios. Os percalços da construção da sua própria estrutura intencional e adaptável não podem servir de entrave para sair das pirâmides hierárquicas do passado. A jornada é contínua.

Herman Bessler é consultor, fundador e CEO do grupo Templo.cc, conselheiro de startups e empresas, além de co-fundador e líder de negócios do Instituto Brasileiro de Ciência de Dados (Bios-Unicamp)*